Este blog foi montado com o intuito de retratar experiências de professores de SwáSthya Yôga que dedicam suas vidas a praticar, ensinar e difundir esta fantástica filosofia de vida.



quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Sensibilidade e o conceito de espaço vital




Você já percebeu que quando entra em algum lugar público, cinema, teatro, sala de aula, e já existem lá algumas pessoas desconhecidas acomodadas é raro que você escolha se sentar próximo ou quem sabe exatamente ao lado de alguém?

Comece a perceber...

É que temos em torno de nós o chamado espaço vital.

"Espaço vital é o espaço territorial de uma pessoa, que varia conforme a raça, o país e a educação de cada um.
...
O espaço territorial de uma pessoa é aquele que ela se reserva o direito de usufruir e, dentro de cujas fronteiras, qualquer ser humano é persona non grata. Eventualmente, abrem-se excessões para os amigos, parentes e entes queridos, desde que saibam seus limites e sejam comedidos nessa invasão concedida." *

... veja que a excessão ocorre justamente para as pessoas que no termo corriqueiro chamamos mesmo de "chegadas".

Brincadeira a parte, o fato é que temos em torno de nós um espaço dentro do qual sentimo-nos bem.

É um espaço que, na maioria das vezes, inconscientemente, entendemos como território, para ser compartilhado ou não, dependendo da situação.

Resolvi falar sobre isso, porque há pouco ocorreu comigo uma situação engraçada que me fez lembrar deste conceito.

Estava trabalhando, sentada ao computador, completamente imersa em meus pensamentos, quando me dei conta, com um susto e tanto, que um colega sentara ao meu lado.

Ele já estava ali há alguns instantes, não quis interromper, mas também não quis deixar de ser notado já que veio até ali para falar comigo.

Como somos bem próximos, não me incomodei, nem com a aproximação e nem com o susto.

Por outro lado, é bem provável, que se a situação ocorresse com alguém estranho a mim o desconforto seria bem grande.

Em muitos casos, uma aproximação como essa poderia gerar até uma certa rusga.

Isso porque consideramos uma proximidade física "não autorizada" como essa, mesmo que não escrita em código algum, falta de educação, invasão de limites ou de privacidade.

"Boa parte dos princípios de boas maneiras pode ser fundamentada na teoria do espaço vital.
...
Observe que muito do que se denomina etiqueta social é, nada mais, nada menos do que o estabelecimento formal de limites." *

Pode parecer um certo exagero da minha parte, até porque cada um lida de uma forma com essa área de conforto.

Enquanto uns recuam ou sentem-se mal porque alguém desconhecido se senta à mesma mesa em um lugar público, outro, na mesma situação, até é capaz de puxar assunto.

Exagero ou não o caso é que existem limites, invisíveis mas existem.

A observação que faço hoje não é nem tanto a respeito de como trato do meu espaço vital, mas como me relaciono com o dos outros.

É uma questão de sensibilidade, e em um certo sentido de educação.

Muitos dos pequenos atritos diários podem ser minimizados ou completamente deixados de lado pela simples observação da área de conforto do outro e consequente respeito à ela.

Aprender a observar, respeitar e compreender a necessidade de espaço que as pessoas à sua volta têm pode fazer com que, em curto espaço de tempo, suas relações pessoais subam a um nível elevadíssimo de refinamento.

Tomando consciência dos limites das pessoas com quem convive, você poderá, ao agir de acordo com esta consciência, tornar-se mais amistoso, mais agradável e mais desejado de se conviver.

O melhor disso é que, tornando-se uma companhia mais agradável, certamente o que virá dessas pessoas, será a natural retribuição. De mais espaço, mais educação e compreensão para os seus próprios limites.

Vale a pena investir, mesmo que a contrapartida não ocorra.

No mínimo, nos tornaremos, pela simples observação do outro, mais refinados e sensíveis.

A partir daí, também, não será pelas nossas ações que os eventuais atritos serão iniciados.

Isso, por si só, já parece algo desejável.

Para aprimorar ainda mais este comportamento, vale lembrar que este espaço é mais sutil do que pode parecer.

As situações como uma música alta, ou um berro de chamado quando alguém encontra-se concentrado em algo parecem, a meu ver, tão invasivas quanto uma proximidade indesejada.

Ou um perfume, exagerado, que possa inclusive gerar mal estar ao outro, que não o escolheu.

Não bastasse isso, entravar o ir e vir alheio, opinando a respeito de suas companhias, de seu modo de vestir, de falar, de se movimentar, sem que esta sugestão seja formalmente pedida, não parece invasão também?

A mim parece...

Mostra-se mais trabalhoso agora, mas, se quisermos preservar e sutilizar nossas relações, já temos um bom guia para seguir: observar o que pode ser invasivo ao outro, por mais sutil que seja, e agir de forma a não instigar qualquer comportamento indesejado.

"Se você quiser preservar uma amizade ou um relacionamento afetivo, metabolize esta regra áurea: a única maneira de prender alguém é soltar; a melhor maneira de perder alguém é cercear sua liberdade ou invadir sua privacidade." *

*Para aprofundar: esse conceito e as citações aparecem em um livro de boas maneiras, escrito no contexto do Yôga, mas para a utilização irrestrita e geral de todos que o quiserem.

(Boas Maneiras no Yôga é o seu título, DeRose o autor, publicado pela Nobel editora)


Julia Rodrigues



terça-feira, 21 de outubro de 2008

Recriando a realidade




Outro dia, observando atletas, fiquei pensando sobre como o corpo se adapta ao estilo de vida. É fácil identificar quais deles praticam o mesmo esporte, pois a postura, o andar e os músculos desenvolvidos são muito específicos.

No caso deles, esta mudança é marcante, pois usam o corpo de forma intensa. Mas como será que isso se aplica em um cotidiano rotineiro, caso da maior parte das pessoas?

Noto que o corpo também se adapta tornando mais confortáveis as tarefas que realizamos com maior intensidade, excelente para um pedreiro que trabalha carregando peso e precisa de um corpo forte, ou para um piloto de moto que requer reflexos mais rápidos. Entretanto, no caso de ficarmos somente em casa assistindo tv, grudados no computador, ou sentados com as costas curvadas o dia inteiro no trabalho, essa proteção que possuímos acaba nos prejudicando.

Isto é percebido quando se torna cada vez mais difícil andarmos com as costas eretas, quando passamos a ficar mais pesados para algo que antes fazíamos sem esforço e, para não me prolongar nesta lista infindável, quando nosso organismo se modifica para podermos comer mais e mais.

Da mesma maneira que nosso corpo está sujeito a essas transformações, também estão nossas emoções e pensamentos.

Sim, assim como vamos perdendo dia-a-dia nossa capacidade de movimentação, perdemos também nossa capacidade de viver emoções plenas e de ter idéias brilhantes, conforme nos adaptamos a uma vida sem estes encantos.

O ser humano se transforma para conquistar conforto, então, se você nunca usa pontos de vista diferentes, deixa de se encantar com eventos simples, pára de movimentar seus músculos, seu organismo passa a entender como um incômodo qualquer pensamento criativo, emoção forte ou uma simples caminhada com os amigos, atitudes contrárias às praticadas em seu cotidiano.

Apesar da reflexão, confesso que minha intenção não é produzir pânico. Estou apenas evidenciando uma ferramenta que possuímos e, como tudo no universo, que podemos escolher como iremos utilizá-la.

Assim, a partir de agora, saiba o quanto suas escolhas estão constantemente reorganizando tudo o que você é, produzindo sulcos em seu corpo, em suas emoções e pensamentos, para que tais decisões aconteçam cada vez mais espontaneamente.

Para perceber os condicionamentos de seu corpo, tente experimentar alguns movimentos ou posições que nunca fez antes. Onde o corpo mais reclamar é onde está formada uma couraça que um cotidiano monótono nos traz.

Depois façamos o mesmo com nossas emoções e pensamentos. Você verá que, a princípio, é muito difícil fazer um outro caminho para o trabalho ou enxugar o corpo após o banho de forma diferente. E é mudando estas pequenas atividades que desenvolvemos nossa capacidade de transformação. Comece assim e depois estimule eventos e coisas que vão conduzi-lo a mais felicidade, mais plenitude e mais diversão. Isto o fará notar que, sem mudar nada ao seu redor, estará em um mundo completamente belo, harmônico, totalmente aberto e receptivo às suas vontades e o mais importante: absolutamente real.


Thiago Duarte


domingo, 12 de outubro de 2008

Auto-Mobilização





Esta semana estive pensando em como os “autos” estão na moda; até o Yôga que ensino se chama SwáSthya, termo sânscrito que significa auto-suficiência. Ligo a televisão e encontro dezenas de programas discorrendo sobre auto-sustentabilidade. Leio entrevistas com esportistas e, auto-superação é o ó do borógódó; banqueiros falam em auto-controle e eu mesmo corro atrás de auto-conhecimento. No entanto, gostaria de pedir um minuto de silêncio ou de interrupção da leitura para os 800 auto-móveis que invadem o Estado de São Paulo diariamente, nos fazendo crer que sejam um mal necessário, uma vez que não temos uma decente e segura malha de metrô que corte a cidade de cabo a rabo como a cidade de Paris e New York, as quais, diga-se de passagem, não possuem o tamanho nem o contingente da megalópole paulista. Fazendo uso dos neurônios, creio que a disseminação dos “autos” acontece por duas razões: embora a globalização tenha chego para ficar, com toda essa parafernália tecnológica, estamos cada vez mais auto-sustentáveis, presumindo que podemos viver em uma bolha de isolamento sensorial. Não obstante, em contrapartida, vejo a compreensão por parte das pessoas de que não podemos mais esperar para que as coisas sejam feitas ou modificadas. Em outras palavras, nós mesmos temos que tomar a direção dos fatos, pois pelo visto e pela espera, ninguém fará por nós. Fernando Pessoa escreveu de certa feita: “Pedras no caminho? Guardo todas. Um dia vou construir um castelo”. O que quero dizer, é que não importa se o que pudermos fazer seja pouco ou de ínfima efetividade diante do infindável buraco negro no qual nossa sociedade se encontra: sempre terá sido de valentia valia, sobretudo se cada um fizer a sua parte. Certa vez uma floresta estava em chamas e a fauna toda saiu em disparada. O leão avistou o pássaro, em seu esforço sobre-animal, indo e vindo com um balde cheio d’água em seu bico. O leão chamou a atenção dos outros animais para o fato, e todos gargalharam da ave. Lá de cima, ela bradou: “Pelo menos estou fazendo a minha parte!”

Microcosmos devem auxiliar o macro. Paremos de esperar auxílio de divindades ou de papai universo e mamãe natureza; das pequenas, faremos as grandes. As tentativas dos governantes parecem não ser suficientes, autênticas ou realistas. A sociedade está se mobilizando para cuidar de algo que é nosso, as leis dos homens e os recursos naturais. As mais eficientes mudanças são aquelas que partem de nosso interior, pois além de terem sido criações nossas e por isso mesmo, há uma grande probabilidade de terem sido necessidades que encontramos no meio do caminho, portanto, acreditamos nelas e isso, faz toda a diferença.

Tudo na natureza segue seu curso irrefreadamente. Há uma troca contínua, um círculo virtuoso, ação e reação, dar e receber, ir e vir, nascer e morrer, desenvolver e transformar-se... essa percepção é de maciça importância para nossa relação com ela e com nossas próprias vidas. Não podemos só sugar, extrair sem devolver as possibilidades de seu renascimento, é uma via de mão dupla. Muitas vezes, parecemos àquele adolescente mimado que só quer ser sustentado e nada dá em troca. Sustente-se meu amigo, pare de ser sustentado.

Há tempos que, em minha opinião, ser elegante (em todos os sentidos) é ser consciente. Grande parte das pessoas ainda dorme o sono da ignorância, absortos em sua flácida inconsciência, não se deparam com tudo o que está a sua volta. Ao içá-las ao patamar de consciência, o Yôga incita dentro delas o impulso de Eros, aquela chama de vida que estava esquecida em algum ermo local dentro de seus corações. Renasce o impulso para a curiosidade e a busca pela sua própria essência. Inicia-se um questionamento de tudo que se encontra a sua volta. Platão já dizia que uma vida não questionada não merece ser vivida. Ao seguir seu instinto pelo saber, sua consciência se expande em todas as direções, aumentando o seu grau de exigência e quase que paradoxalmente de tolerância com relação a tudo e a todos, pois além de reeditar a seleção em sua existência, também sente a necessidade de orientar àqueles que necessitam, pois começa a perceber que quanto mais aprende, mais percebe o quanto ainda não sabe. Esse incremento de consciência se estende ao ser, ao saber e até ao vestir. Entende-se que aquilo que se veste é também conseqüência de seus atos e uma extensão de quem você é realmente é. Antigamente, desfilar coberto com casacos de peles de animais era considerado chique e motivo de status. Talvez pelo desconhecimento ou pelo desinteresse da grande massa de como aquelas peles eram obtidas. Hoje, considera-se extremamente deselegante e de calibrado mau gosto fazer uso delas. E lavar carros em frente de casa? Recordo-me que quando era criança, lavar carro aos domingos a frente de nossas moradias era sinal de descontração prazerosa, socialização com os vizinhos, cuidado com seus pertences e para alguns, até mesmo, sinal de higiene. Atualmente, deixar a mangueira correndo solta é puro sinal de desconexão com o momento presente, é reacender aquele velho chavão de que nós, dentro de nosso egoísmo e falta de senso de perspectiva a longo prazo, não enxergamos além de nosso próprio umbigo. É o retorno daquele tacanho pensamento de que alguém resolverá, os outros darão um jeito... Só que nos esquecemos de que os outros somos nós mesmos. Afinal, quem pôs os políticos lá?
 
Fábio Euksuzian



sábado, 11 de outubro de 2008

Tristeza



 
 
Numa tarde, em que estávamos no escritório de DeRose, um lugar cheio de livros e com pouco espaço disponível, revíamos, confortavelmente, um livro. De alguma forma, a conversa que se ia desensenrolando derivou para a poesia. É normal que, com DeRose, as conversas se desviem quando aparece algum assunto interessante e depois retomem o rumo inicial, se este o merecer. Da poesia fomos para as lembranças pessoais, e ele recordou-se de um poema que tinha escrito há muito tempo.

Graças à música que os poemas transportam consigo, tinha ficado guardado na memória do Mestre. Porém, demorou alguns minutos para retomar a sua forma original.

Quando as palavras já se tinham organizado e eram as exactas, escreveu-o, pronunciou-o, tocou-o como um brinquedo antigo que se reencontra depois de muito tempo. Ao olhá-lo dava para sentir o carinho que ele nutria pelo poema, talvez pelo momento em que ele tinha sido escrito.

Depois, com um ar de nostalgia, comentou essas coisas que se escrevem e que ficam guardadas numa gaveta… se alguma vez publicares o teu livro de poemas, podes colocar esta poesia, uma vez que é inédita.

Claro que até ao dia de hoje eu guardo esse poema, na esperança de o conseguir editar.

Que melhor ocasião que esta para reproduzir-lo, trazendo-o à minha memória.


TRISTEZA
(poema inédito de DeRose)
 
Estou triste
por ter ficado triste.

Triste estou
porque a tristeza existe.


Anahí Flores